sábado, 11 de abril de 2009

Contos de Espionagem



Capítulo 2 - Xeque-Mate em Dois Movimentos

Jåµë§ ßønd nunca esquecera dos tempos finais da guerra fria quando, ainda inexperiente, aprendera alguns truques simples de sobrevivência e recursos que vão além da tecnologia de ponta da Comunidade. Mais de uma vez a tinta invisível, a escrita formada basicamente por ácido úrico, permitira enviar mensagens escondidas em correspondência simples. A chama de uma vela ao esquentar a caligrafia feita com seu próprio dejeto revelava informações vitais para o cumprimento de alguma missão.

Em tempos de comunicação monitorada e invasão de privacidade o meio mais primitivo pode ser mais funcional. A mullah disfarçada disso tudo sabia, pois seu sinal para um possível cúmplice foi o simples reflexo de seu espelho na direção do provável atirador. Enquanto os técnicos de segurança anulavam freqüências suspeitas, o mais simples dos métodos passaria despercebido.

Mas não para ßønd.

" Torre para Cavalo. O que você está dizendo ? " - escutou em seu ponto comunicador enquanto corria na direção da mulher em busca de respostas. Sacou imediatamente a ASP, assustando alguns transeuntes no caminho. A simples visão da pistola fizera com que as pessoas naturalmente se afastassem dele, restando apenas alguns desavisados que ßønd empurrava ao chão sem desculpas ou sutileza.

A mulher com cheiro de tâmaras percebeu sua precipitação e correu para o centro do parque, onde a pequenas ruas formam um macabro pentagrama e levavam para o lado oposto da comitiva. Seria uma questão de tempo até que ele a alcançasse e tirasse dela as respostas que procurava. Em poucos intantes, ela subitamente parou, fazendo com que ßønd diminuísse a corrida e lentamente desacelerasse até encarar seus olhos, sempre com a ASP apontada para seu dorso.

" Quem é você e para quem está trabalhando ? " - ele gritou imediatamente. A mulher com cheiro de tâmaras apenas sorriu delicadamente e seu espelho brilhou de encontro ao sol, apenas incomodando os seus olhos.

Durante uma fração de segundo ficou confuso, somente para se dar conta de era um segundo comando. ßønd atirou-se em direção a uma árvore do parque somente para ouvir o zunido baixo de um bala disparada de um rifle automático supersônico se alojar na direção de onde ele estava apenas há um instante atrás. A mulher tornou a correr, agora com seus passos cobertos pelo atirador que se encontrava longe dalí, de uma posição que ele não localizara ainda. Ele pensava que tudo muda muito rapidamente. Era um dia tranqüilo e agora ele lutava pela sua vida em seu próprio país. Estava protegido apenas por um grosso tronco de pinheiro.

Ao tentar um disparo às cegas, uma lasca da madeira explodiu perto de seu rosto quando uma segunda bala atingiu o tronco. Quase fora alvejado por agir sem pensar. Imóvel agora, considerou suas opções.

" Torre para Cavalo. Onde você está ? Responda imediatamente."
" Estou ao norte da Inner Circle, em perseguição. " - mentiu, pois sua situação era mais apropriadamente de caça do que de caçador.

" Volte para o Open Air, o Rei Negro está seguro e estamos tentando localizar o possível atirador. "

Se o serviço secreto não conseguia uma localização exata por satélite era porque ele não estava exposto por cima, e considerando a visão que ele tinha do Open Air e do pentagrama do Regent´s Park a única explicação era...
" Torre, estou em Xeque. Poderia fazer a gentileza de fazer uma varredura infravermelha a 300m ao sul de minha posição ? " - vociferou calma mas ameaçadoramente.

" Como ? " - obteve como resposta.
" FAÇA ISSO AGORA. "

Não deu atenção aos impropérios dirigidos a ele por Robinson pelo comunicador enquanto percebia que a mulher com cheiro de tâmaras desaparecera de visão. Preocupar-se-ia com ela mais tarde. Se estivesse certo, precisaria chegar mais perto do assassino escondido perto dali. Respirou fundo e tentou uma arrancada na direção de onde viera. Os zumbidos de dois disparos abafados com algum silenciador fizeram ßønd acreditar que estava abusando da sorte. Procurou abrigo em outro pinheiro e aguardou, recuperando o fôlego.

" Torre para Cavalo. Só há dois sinais no momento, próximo de sua posição. Um deles vem de algo que se asemelha a um trailer ao sul de onde está agora. É o nosso alvo ?"
" Afirmativo. Desligo "

A empunhadura da ASP começava a esquentar com a palma de sua mão enquanto refletia seu próximo passo. O ronco do motor do trailer sentenciou sua única opção no momento. O enorme veículo preparava-se para manobrar e entrar no círculo exterior do pentagrama de ruas. Depois de seu aviso pelo comunicador dificilmente ele conseguiria sair do Regent´s Park vivo e isso não levaria a nada, perderiam sua melhor pista.

ßønd levantou e partiu em direção ao trailer erguendo sua arma e apertando o gatilho algumas vezes para atingir os pneus que estouraram ruidosamente, dificultando a fuga do assassino. Enquanto corria o mais que pôde sua visão periférica já notava a movimentação em sua direção - o apoio do SIS - e sentiu que a sorte estava ao seu lado quando o trailer perdeu a direção, deslocou-se vertiginosamente para a direita e chocou-se à uma antiga árvore. Deixara a mulher com cheiro de tâmaras escapar mas este adversário não iria conseguir fugir dele agora.

" Pena, ainda não se adaptou a dirigir pela mão inglesa " - disse entre os dentes enquanto se aproximava velozmente.

Apontando sua pistola para a cabine verificou, surpreso, que o atirador não estava, o que significava que ele estava sozinho no veículo e pulara da cabine. Olhando em volta não havia sinal de fuga repentina ou movimentação muito próxima. Mirou a porta do trailer, semi-aberta e hesitou por um segundo.

Para o que tinha em mente, precisou recarregar sua arma. Colocou uma bala na agulha e disparou. Fuzilando repetidamente a estrutura do trailer e ouvindo subitamente um grito de dor.

" Desculpe, achei que não era educado entrar sem avisar " - soltou num impulso - " agora, sei que sabe como as coisas são feitas. Desarmado, mãos à vista. AGORA."

Um homem baixo, vestido como vendedor comum de guloseimas mas cujo olhar inumano traía sua real vocação saiu do veículos sacudindo levemente os braços em sinal de desarme. Por um instante, fitou ßønd nos olhos raivosamente mas nada disse.

" Quem o mandou matar Faishad Al-Haud ? " - Jåµë§ ßønd perguntou em voz muito alta. Em segundos, reforços estariam chegando e ele queria informações antes. O homem baixo nada disse e ele sabia que teria que ser mais insistente. Aproximou-se, atingiu-o com a coronha, o que fez o assassino se ajoelhar de dor. Encostou o cano da ASP em sua cabeça e disse :

" Acho que não me escutou direito, vamos tentar de novo. "

O homem abriu os olhos e passou a balbuciar em árabe algo para ßønd. A língua não era seu forte, mas reconhecera como uma oração. O árabe levantou-se como um raio e tentou agarrá-lo. Levantou a arma para golpeá-lo de novo... mas nunca teve a oportunidade.

O sangue espalhou-se por toda a roupa de ßønd quando o crânio do assassino explodiu na sua frente com o projétil que a atravessou e criou uma saída através de sua cabeça muito maior do que a entrada. O corpo do homem baixo caiu sinistramente e estrebuchava já sem vida, num reflexo post-mortem.

ßønd se jogara ao chão instintivamente mesmo sabendo que a bala partira de arma aliada. Quando o reforço o cercou, levantou-se tentando inutilmente limpar o sangue com as mãos e fechou comicamente um botão em sua camisa, causando estranheza aos agentes presentes.

" Desculpe. Mas tive minhas ordens. " - disse o líder da ofensiva, um dos agentes palestinos que protegiam Al-Haud. Um jovem moreno, pele marrom, muito alto, pouco comum em sua gente, rosto tranqüilo. Tranqüilo demais para uma ocasião como esta.

" M ficaria orgulhosa de um agente com sua prontidão... " - Jåµë§ baixou os olhos para o morto, e completou : " ...e sua mira excepcional. " O palestino apenas assertiu afirmativamente e se retirou distribuindo ordens e posições.

ßønd foi levado até o Open Air, onde Robinson se encontraria com ele. No caminho pensou que o ataque tinha sido muito simples e quase bem sucedido não fosse pelo detalhe na cúmplice. O idéia de que todas as peças neste jogo mortal sempre sabem seus movimentos riscou novamente seus pensamentos. Poucos instantes depois, o utilitário negro que o transportava deixou-o às portas do gabinete seguro do Open Air. Não demorou a ver que algo estava errado. Aumentando os passos e virando um corredor encontrou-se com Robinson que o encarou sério e apenas apontou para o ambiente privativo da comitiva de Faishad Al-Haud.

Ele não precisava entrar para saber o que iria encontrar. Atravessando a porta, viu os corpos de alguns seguranças particulares abatidos a tiros ( provavelmente com silenciadores ) e Al-Haud também ao chão, com uma pequena marca de penetração em sua testa, de onde alguns filetes de sangue ainda escorriam, com o rosto inexpressivo e olhar perdido.

O Rei Negro caíra.

Fim do Capítulo 2

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