sábado, 2 de maio de 2009

Contos de Espionagem



Capítulo 5 - Apenas Uma Velha Amiga

A visão da janela do avião intercontinental àquela hora tardia proporcionava acima de tudo um espetáculo impressionante mas também a promessa de uma noite tranqüila. A paisagem de cores quentes não excitava os sentidos como deveria, e sim, dava-lhes a oportunidade de apreciar um cenário que no dia-a-dia não se buscava o tempo para contemplar.

Jåµë§ ßønd se permitia a este ponto de sua carreira o melhor do conforto. Os poucos conhecidos com quem ainda mantinha algum contato social e mesmo algumas das mulheres de seu passado consideravam seus gostos esnobes e pedantes. Às vezes, quando se deixava levar pelos comentários, ele costumava dizer-lhes que apenas vivia o dia como se fosse o último. Os risos condescendentes ou de incredulidade que recebia em troca não levavam em consideração o segredo que nem mesmo May, sua fiel governanta, sabia com certeza.

Na sua profissão, todo dia poderia ser o último de sua vida.

Ainda não abrira o relatório que M lhe entregara ao sair de sua confortável sala no MI6 logo após enviá-lo em mais um serviço especial ao redor do globo. Apenas pediu mais uma taça de Martini, enquanto se recostava comodamente na sua cadeira localizada na primeira classe. "As coisas que faço pelo meu país " - riu-se ironicamente. Os seus dedos deslizavam, sentido a rigidez do envelope bege contendo algumas instruções da missão que não haviam sido discutidas no encontro com Faishad Al-Haud. Provavelmente porque nem mesmo ele, que tornara esta investigação possível, poderia saber do desenvolvimento do curso de ação.

Finalmente a curiosidade e a longa viagem o venceram e começou a ler os documentos. A leitura era em quase toda maçante, com uma lista de possíveis contatos, pontos de interesse dos envolvidos e uma indicação de possíveis suspeitos. A voz de M ecoou no seu pensamento:

"Como bem sabe, ØØ7, o passaporte brasileiro é vendido a peso de ouro no mercado negro. Sua população é formada por uma interessante mistura de gêneros e raças sendo praticamente impossível afirmar - sem a devida verificação - se o suspeito pertence àquela comunidade ou não. Para tornar tudo mais complicado, o documento é relativamente simples de falsificar nas mãos de alguém que saiba o que está fazendo. O governo do país vêm prometendo utilizar novos métodos que dificultem futuras fraudes mas até o momento as contínuas ocorrências são preocupantes. "

"E o passaporte do assassino é nossa única pista palpável ?" - ele respondera.

"Sim, infelizmente." - ela disse secamente - "mas nossos maiores especialistas afirmam que o documento foi forjado há menos de 48 horas, provavelmente feito às pressas, o que nos dá uma vantagem a mais. O estilo e método do falsário combinam com modus operandi de Mohammad Ibn Batut. Mas ele está preso numa cela brasileira esperando julgamento. "

"E como eu terei acesso a ele ?"

"Enviaremos alguém para lhe ajudar nesta operação. Vocês se encontrarão no aeroporto internacional do Rio de Janeiro pela manhã."

ØØ7 avançou algumas páginas do relatório para saber o nome do agente enviado mas achou apenas um codinome : Sabra. Ao lado dele a frase senha para o contato.

Esta palavra de alguma forma lhe era familiar. Talvez alguém com quem trabalhara no passado ?

Quase não descansou durante todo o início da noite planejando suas ações nas horas que seguiriam o seu desembarque em São Paulo, formulando inclusive possíveis rotas de fuga e repetindo todos dados necessários para o seu disfarce. Quando o sono o alcançou, seus sonhos envolviam olhos felinos e pele muito branca. Podia jurar que sentia um odor de frutas enquanto corria atrás de uma figura de mulher que se afastava cada vez mais dele.

Acordou com o aviso do piloto de que iriam desembarcar em minutos. Uma idéia brilhou em sua mente e a ferramenta certa para talvez descobrir um mistério estava a seu alcance, mais especificamente no bolso interno de seu blazer.

Ligou seu potente celular, modificado segundo algumas especificações da Seção Q, e rodou um navegador de internet adaptado para dispositivos móveis. Através de uma ferramenta de busca pesquisou o nome que desejava. Em poucos segundos uma lista de possibilidades apareceram em sua pequena tela.

Sabra poderia ser o nome de uma companhia de automóveis. Poderia ser também um tipo de chocolate. Descendo a lista de possibilidades uma fez seu sangue efervescer.

"Sabra é o nome para descrever judeus nascidos em Israel." - leu em voz baixa. Agora tudo fazia sentido. Há muito tempo esperava por uma oportunidade de reencontro e seu coração acelerou. Neste momento, percebeu a figura de uma comissária de bordo ao seu lado e uma voz doce e calma de leve sotaque :

"Neste vôo não permitimos celulares ligados, senhor "

ØØ7 olhou para cima e seus dentes pareceram estalar ao ranger. Uma mulher de cabelos negros bem curtos e pele apenas adequadamente bronzeada, quase tão alta quanto ele, de olhos azuis frios mas belíssimos o fitava com desdém e soberba. Era ela, finalmente, depois de tantos anos.

" Bat-Seraph" - ele balbuciou.
"Por favor, me chame de Sarah." - ela respondeu polidamente - "por favor, pode me acompanhar ?"

Ele se levantou com movimentos ágeis e ficou à altura de seus olhos azuis acidentalmente ficando a poucos centímetros de sua boca deliciosamente pequena e indecente: "Certamente... Sarah."

A voluptuosa mulher o conduziu até uma sala privada na parte traseira da embarcação e ßønd se certificou de que ninguém os notara... ou seguira.

Ao adentrar o pequeno recinto, Sarah Bat-Seraph lhe entregou uma bagagem de mão e o encorajou a abrir.

ØØ7 destravou o fecho da pequena mala e sorriu satisfeito ao ver sua pistola Walther P99, 2 clips extras de munição e um silenciador adaptável.

"M achou que isto poderia ser útil".

Ao verificar a trava, ele displicentemente carregou a pistola, anexou o silenciador e respondeu à bela mulher :

"Sim. Chegou em boa hora."

Como um raio, trancou a porta da cabine e com a mesma mão esquerda cravou todos os dedos no pescoço fino de Bat-Seraph empurrando-a numa parede e encostando com força o cano do silenciador embaixo de sua mandíbula. Ela não esboçou a menor reação para a sua surpresa.

"mmmmmm...Isto é jeito..mm.. de tratar uma aliada ?" - as poucas palavras que pôde recitar.

"Talvez eu devesse estender a mesma cortesia que me ofereceu, quando me traiu, drogou, torturou durante dias e me deixou para morrer em Teerã, o que acha ?" - disse num misto de sarcasmo e raiva.

" Era apenas o meu dever e eu sou muito boa no que faço. "

" E eu sou o melhor no que eu faço." - destravou a pistola e em seguida apertou o gatilho.

Fim do Capítulo 5

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